Ouve-me. Fecho as portas da criação e assumo nova personalidade maldita. Revejo-me naqueles pequenos tormentos de uma noite com uma calmaria chuvosa, e partilho a sensação com a condensação que se forma no vidro que me separa do lado de lá. Brinco, o indicador move-se de forma livre, formando simples aglomerado de linhas cuidadosamente desalinhadas, de tal modo insignes na sua existência que a banalidade é incapaz de as atingir. Subitamente, uma gota de água parece ouvir o meu apelo ao infinito, quedando-se pelo composto de sílica, e terminando uma longa viagem. Ausculto o meu pensamento, servindo-me do raciocínio imediato para descobrir a origem deste anjo caminhante. “Porque embateste no meu vidro?”, pergunto, inocente de tal força existencial. No entanto a resposta nunca vem para o lado de cá. Perdido neste mar de irracionalidade, e sem saber qual o caminho que seguir, remeto-me aos confins da minha existência, precavendo a sanidade inexistente.


Vê-me. Tento encontrar-me a mim mesmo num Mundo de sonhos co-habitados. Procuro a minha hipotética alma num mar de certezas físicas, sem a encontrar. Questiono-me de novo sobre a falta de resposta da gotícula, encontrando agora uma pista desajeitada. É a minha falta de composição austral que me causa estas falhas comunicativas? Procuro a via imediata, mas o meu lado racional não fica impávido, erguendo-se e tomando momentaneamente as rédeas. “Estarei a ficar louco?”, reitero eu para mim mesmo, exercitando a minha capacidade de diálogo individual, mesmo estando confinado à solidão de uma mera divisória de um apartamento. O racional desapareceu, perdeu-se algures num dos meus quartos. Talvez aquelas tenham sido as suas palavras, talvez a sanidade esteja comprometida pela sua precoce largada. A procura acesa de tão importante minúcia cessa, não existem provas de um crime fatalista. Onde estás?


Sente-me. Doce brisa de Outono cobre o meu corpo. Desliza, gratuitamente, levando todas as minhas células de epiderme, aquelas que já terminaram o seu período de vivência. As outras podem quedar-se pelo meu corpo, preciso delas para me proteger dos perigos do exterior. Encontrei! Aqui está de novo o meu ser racional. Espera! Partiu, de novo, desta vez de lanterna na mão. Será que encontrou algo novo, algo em mim que desconheço? A central eléctrica apenas ilumina uma pequena parte de todos estes compartimentos, a iluminação craniana é um mito. Tento coser todos aqueles pequenos pedaços que de mim caíram, tentando dar-lhes o destino correcto dentro de um ser espontâneo. Compostagem de ideias? Encontro-me perdido no sentimento indescritível. Ele possui o meu corpo, controla os meus dedos e pestaneja por mim.


Pensamento indescritível. Repito o nome, repito, repito, repito… Se és indescritível, porque irei tentar definir-te? Onde andas, quem és e o que fazes? Lanço-te três questões, mas tu estás mais preocupado em tornar-te vivo, em existir. Não te censuro, a existência é algo que faz de nós simples material, é algo que nos une atomicamente. Cessei definitivamente todas as buscas pela minha racionalidade. De que me serve olhar para dentro e tentar agoirar o futuro, quando o imediato me satisfaz de forma esplêndida? Queres alimentar-te de mim, queres ser um somatório de todos os flagelos, e eu não sou forte o suficiente para não ser permissivo. Encontro segurança nesta solidão pensativa, dilacero toda e qualquer hipótese de te racionalizar, tu tornas-te vivo e presente na ausência (dele). Fica, entra e comunica. Não te posso entender, mas posso oferecer-te uma boa estada. Não é isso que prentendes?

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O quê? Já estamos a gravar? ups..
Olá pessoal!
É só para dizer para quando comentarem, não insultarem ninguém (a não ser que tenham razão :D), não fazer Pub., e principalmente não desiludir a vossa mãe, e ser bem-educado ;)
(Ou podes também fazer o contrário de tudo, mas arriscas-te a ver o teu comentário apagado! :D)
Vá agora deixa-te de merdas e comenta! ;)
Thanks!

Anonymous armyofufs disse:
Gostei!
Aliás, devo admitir que aprecio bastante mais, digamos que, "lirismo sob a forma de prosa" do que poesia.
Enfim, preferi as temáticas que abordaste no teu último "Quaere verum", mas não deixam de ser interessantes as imagens que crias textualmente.

Fica bem ;)
29 de novembro de 2009 às 11:47